sexta-feira, julho 31, 2009

Preces versão 45.0

Chegou pelo antigo correio o prometido envelope de Campanhã. A mesma letra que adoçou outros envelopes mais urgentes. Dentro, um CD pintado como um autocolante dos campos. Dentro, um fim-de-semana de fotos das Preces, da Mónica e da Helena, da última vez em que estivemos juntos. Dentro, um mar de amigos para guardar na memória (parece a cena do Aconteceu no Oeste, tudo dentro de… como as balas nos homens e nos guarda-pós, falta a música do Ennio Morricone, que ainda não reaprendi a meter na linha).
A paisagem de anos. Os rostos mais afiados pelo tempo. E tantos futuros a brincarem sem saberem ainda o que sabemos. Dançam, cantam, dedilham a viola, olham o Napoleão, trepam ou descem os socalcos, tudo com outro ritmo e ainda outra motivação. Assim se guardam gerações. Assim continuamos esta nossa imensa minoria de gentes e de prazeres. Há letras (como os desenhos que com elas faz a Mónica!) que poderiam ser fonte do Windows. A caligrafia da Helena também. E a do Cabrita. Um dia será possível pelo Windows escolher e escrevermos com elas. Não como elas. A foto é que é delas.


quarta-feira, julho 29, 2009

história com as poucas palavras disponíveis


numa tarde tórrida na serra da Freita vimos surgir ao longe um pontinho negro que depois se revelou uma figura humana veloz, congestionada e curvada sobre si mesma, que andaria ali a fazer?


chamava, por entre insultos, um rebanho pacífico. quantos anos tinha? 50 + 27, e boas pernas, sim senhora, só a coluna aleijada numa queda em miúda, quando tínhamos vacas e cavalos, agora só estas ovelhitas.


não teríamos um copito de sumol? que a sede era tanta! e a pressa maior ainda.


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quinta-feira, julho 23, 2009

Manuel Alegre

Não sei quantas legislaturas desde a constituinte, desde quando eu era menino. Deixou o parlamento e, como no seu poema, alegre se fez triste. Se os partidos fossem equipas de futebol a coleccionar cromos na caderneta, sim, desde quando eu era menino, o Manuel Alegre seria um cromo para guardar, valor ímpar de troca. Embrulhado como os da bola num antigo rebuçado, deixar-nos-ia nos lábios o sabor da Democracia na sua essência plena. Por isso raro. Por isso o meu «carimbado»!

terça-feira, julho 14, 2009

Operação Vagô

A história do avião desviado
por João Miguel Rodrigues.
"Dia 10 de Novembro de 1961, sexta-feira. O Super-constellation da TAP Mouzinho de Albuquerque descola à tabela do Aeroporto de Casablanca, em Marrocos. Eram 09h15. O comandante José Marcelino e o co-piloto Raul Teles Grilo ganham altitude, alinham o avião na rota para Lisboa e permitem aos passageiros desapertar os cintos e acender os cigarros. Estava bom tempo. A viagem, de cerca de hora e meia, prometia ser calma. Mal sabia a tripulação que entre os 18 passageiros seguiam seis guerrilheiros, inimigos jurados do regime, chefiados por Palma Inácio. A calma a bordo foi interrompida mal à meia hora de voo. Hermínio da Palma Inácio entra de surpresa pela cabina de pilotagem – e aponta o revólver à cabeça do comandante: “Isto é uma acção revolucionária. Não quero fazer mal a ninguém” – diz. Nunca, na história da aviação comercial, um avião fora tomado no ar. O plano dos revolucionários é arriscado: pretendem seguir na rota para Lisboa, simular a aterragem na Portela e voltar para trás, em voo rasante sobre a capital, Barreiro, Setúbal, Beja e Faro, para lançarem 100 mil panfletos com apelos à revolta popular contra a ditadura. Aterravam sãos e salvos em Tânger – onde Palma Inácio e companheiros esperavam asilo político. O co-piloto Teles Grilo, o mecânico-chefe António Coragem, o mecânico de voo Alberto Coelho não disseram palavra. Apenas o comandante Marcelino, ameaçado pelo revólver, tentou com serenidade demover o guerrilheiro. Disse que o avião não tinha combustível para regressar a Tânger. Mas Palma Inácio, que era mecânico de aviões e tirara nos Estados Unidos a licença de piloto de linha aérea, estava seguro do que fazia. Exigiu os registos de voo do Super-constellation – e verificou que os tanques tinham sido atestados em Casablanca. Havia gasolina à farta. O comandante tentou outro truque: “Como é que vai lançar os papéis? Eu não posso abrir as janelas do avião” – disse José Marcelino. A resposta de Palma calou-o: “Pode, pode. Voa o mais baixo possível, despressuriza as cabinas e abrimos as janelas de emergência.” Palma Inácio tinha a situação dominada. Lá atrás, a aventura também não podia correr melhor. Os outros cinco revolucionários nem sequer foram obrigados a levantar a voz e a mostrar as armas. O comissário de bordo Orloff Esteves e as duas assistentes, Maria del Pilar e Luísa Infante, aceitaram participar naquele momento histórico – e até ajudaram a lançar os panfletos. Nem todos os 13 pasageiros (americanos, espanhóis, belgas e dois portugueses) compreenderam que o avião fora tomado de assalto: só ficaram a saber depois da aterragem em Tânger. A cerca de meia hora de Lisboa, momentos antes de iniciar os procedimentos de descida, o comandante Marcelino contacta a torre de controlo – e recebe autorização para aterrar na pista 05. Faz a aproximação – mas, no último momento, acelera os quatro motores a hélice: o avião ‘borrega’ sobre a pista, ganha altura e afasta-se do aeroporto. José Marcelino volta a comunicar com a torre – e tenta explicar ao controlador, por meias palavras, que a bordo o obrigam a fazer um voo rasante sobre Lisboa e outras cidades a sul. “Repita lá?” – dizem-lhe da torre. A comunicação é interrompida pela voz de um general da Força Aérea, Costa Macedo – que pilotava um monomotor, percebeu tudo e deu o alerta. Minutos depois, dois caças F-84 levantam voo da Base de Monte Real: descolam com ordens para abaterem o avião da TAP caso não conseguissem obrigá-lo a aterrar em solo português. O Super-constellation iniciou então um perigoso jogo do gato e do rato. O avião teria de voar baixo, a escassos 100 metros de altura, para fugir aos radares e iludir os caças. A manobra era perigosa, só ao alcance de pilotos de elite. Os seis revolucionários tinham levado 100 mil panfletos, impressos em fino papel de seda, na bagagem de mão. O avião passou a rasar a estátua do Marquês de Pombal, sobrevoa a Baixa, guina sob Alcântara. Uma chuva de papéis cai sobre Lisboa – o mesmo no Barreiro, Setúbal, Beja, Faro. Cem mil panfletos voaram das janelas do avião. A missão estava cumprida. O Super-constellation, como estava previsto, aterrou no Aeroporto de Tânger, em Marrocos, às 12h50 de 10 de Novembro, sexta-feira. A operação mereceu honras da Imprensa internacional – era o que os revolucionários pretendiam. Salazar espumou de raiva."
Palma Inácio faleceu hoje!

segunda-feira, julho 13, 2009

No teu deserto

Comprei depois de uma entrevista que li sobre o livro. Começas a ler e viajas. Já o vivi noutros contextos. A «Bonança no Deserto», num Outubro de Marrocos com o Mocamfe e a Intercultura. Tem também muito da nossa linha. Lê-se de um fôlego. Já cá canta!

Aventura na mina

A Mónica diz que é com mochilas que iremos. Lembram-se de “Uma Aventura na Mina” da Ana Magalhães e Isabel Alçada? O rebuliço na estação de Coimbra e um dos nossos campos dentro de um livro? E o livro “Os Campos” por dentro dos nossos campos? É desejo que não quero contrariar. Um dia destes cruzar-se-ão dois comboios, um do Norte, outro do Sul, Coimbra-B a fazer de arrumador, a estacioná-los para meterem água, ou gin, ou vinho, ou apenas a arrumar corações que ainda se inquietam. No Verão há uma ventoinha cromada a soprar o ar. No Inverno haverá lenha e fogo preso junto aos pés. Guardem os desejos que ainda são desejo. Guardem apetite para um jantar que terá como ementa uma conversa por acabar. Um dia destes convido-vos para um encontro a três que nos falta como o ar que respiramos. As Preces foram um ensaio. Agendem o dia. Quando? Já estou a fazer gelo e a escolher os melhores vinhos e todas as músicas que há anos não vos coçam os ouvidos.

domingo, julho 12, 2009

nas minas








Há no abandono do lugar, quente, qualquer coisa de fascinante e de novo. A boca do mundo abandonada ali no Alentejo, Minas do Lousal, perto das Ermidas do Sado / Grândola. A terra estala calor e pó, cheira a terra de morte tal como morreu parte deste país esquecidamente mineiro.

Aquela terra existiu porque existiu uma mina de pirite, levou muitos e muitos homens ao fundo, fez-se de vida à superficíe e foi um século de um Portugal agora quase desconhecido. O documentário apresentado, do tempo do Estado Novo, mostra uma terra intensa com cerca de 8 000 habitantes, a escola, as festas, a igreja e a mina no centro da próxima existência. Parou de respirar a terra quando a mina fechou e hoje, os cerca de 700 habitantes, restam doridos nessa morte violenta.

O projecto Relousal recuperou parte do lugar com um centro de artesanato, um museu das Minas, uma pousada, um restaurante fantástico onde, aos fins de semana, o grupo coral de antigos mineiros canta (de forma soberba!) num canto do antigo armazém e onde no próximo dia 21 Julho se inaugura um novo centro de Ciência e Vida. Mas o lugar cheira a abandono, a terra a estalar de calor e a terra de silêncio. O silêncio do fundo do mundo e o silêncio de um passado português que quase esquecemos. Rural, doloroso, injusto, mineiro.Profundo.

Esta foi a memória esquecida que,calada naquele abandono, me fascinou na visita ao Lousal. Esta foi a história que as crianças pisaram no pó. Esta, é uma visita a fazer.

(As fotografias em nada reproduzem o local, truncam o lado visível da terra viva, e não são mais do que as imagens dum armazém abandonado cuja decadência e abandono, me fascina muito. Não sei como nunca ninguém se lembrou de lá filmar...)


sexta-feira, julho 10, 2009

Mesmo agora

No intervalo do trabalho a estas horas, fui ao faceboock abrir uma garrafa de tinto e acender uma cigarrilha. A Cristina, a provar vinhos italianos, abriu-me o apetite. Aqui o processo é mais aconchegado. O vinho tem tempo de abrir até ao fim da cigarrilha. Limpar o copo como quem cuida de palavras para prenda certeira. A Helena a caminho do Alentejo. A Mónica no seu Porto de abrigo. Pronto, limpo só um copo! Ops… trabalhinho, trabalhinho!

segunda-feira, julho 06, 2009

À minha maneira

O mundo parou nos écrans de TV, para além dos mais de 80.000 que presenciaram o acto. O número 9 tem outra vez um mesmo nome: Ronaldo! É Real. É uma realidade. Era quase impossível não ver. O futebol tem esta força, mesmo para ti, não escondas, que levas os olhos para outros sítios em tantos fins-de-semana. Mas quem ganhou mediaticamente foram outros pontapés. Os XUTOS. Com eles, sim, já gastaste olhos suficientes. Vês como nos desconstruímos com o mesmo vício dos pontapés?

sábado, julho 04, 2009

negra infância azul





( Cascais, Julho 2009)

quinta-feira, julho 02, 2009

o mundo - num livro


comprar um livro por 2 ou 3 frases que alguém escreveu sobre ele num jornal qualquer já me foi muitas vezes desastroso (e, no entanto, continuo a fazê-lo) mas, desta vez, foi um tesouro o que encontrei. nunca li nenhum dos romances de Juan José Millás mas senti-me imediatamente atraída pelo subtítulo da sua autobiografia "O Mundo": "o mundo é a rua da tua infância". porque outros livros de outras infâncias me fascinaram, porque a minha própria infância é um livro por escrever que se passeia em frases soltas na minha memória, porque o mundo e o modo como o vejo me chegam frequentemente intactos como os conheci (e estranhei e inventei) nos meus primeiros anos de vida.

o Mundo é daqueles livro que se lê com gula (poupando cada página para lhe preservar o sabor) e que a mim me envolveu numa volúpia - de conhecer e amar aquela criança extraordinária que Millás escreve que foi - muito, muito, semelhante à que me avassalou em Uma História de Amor e Trevas (outra criança escrita por quem me apaixonei perdidamente).

"«Repara, Juanjo, cauteriza a ferida ao mesmo tempo que a causa.» Compreendi que a escrita, tal como o bisturi do meu pai, cicatrizava as feridas no mesmo momento em que as abria e descobri porque motivo eu era escritor. Não fui capaz de fazer a reportagem: acabava de ser atropelado por um romance."

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