tisana para a gabbiano
(foto Luz Fava)Quando Coimbra foi o espaço onde as noites eram maiores que os dias e a música não era apenas fado, a memória foi crescendo como os líquenes nas rochas do Mondego onde não íamos (não era essa balada a nossa saudade).
Vivíamos todos no nosso tempo certo da juventude, numa precária alegria como a efémera energia de quando se juntam os lábios.
Um dia o beijo quebrou-se.
Ventos do Norte, ventos do Sul, soprando-se loucamente.
Ficaram por cartas dispersas as palavras. Permaneceram alguns rostos como caçadores furtivos nestes pontos cardeais.
Os decisivos guardaram-se como estrelas na constelação «filantropia», apenas vista perto de Órion no último dia de cada Verão durante dezasseis minutos (o mesmo tempo da idade que fomos quando o sentes!) e que precisaram de um novo ritmo para fazer chegar a luz que lhes pertence, porque a nós ficaram como herança por inteiro.
Astros que precisaram de tempo para depositar em anos-luz, agora altivos, a sua imagem decantada.
Quem bom. Finalmente chegaste! E com palavras, como sabias já tão bem somar no tempo em que era decisivo juntar apenas os lábios.
posted by David (em Coimbra B) @ 00:55
4 Comments:
As palavras são apenas a linha que me permite chegar-vos. Com o tempo, aprendi dos riscos de confundir a escrita com a vida, e passei a usar as palavras com parcimónia e contenção. Mas ficou sempre a paixão da escrita, por isso as vou arrumando (às palavras) em caixotes empilhados num recanto improvável da saudade, para um dia, ...?
Nunca cheguei a partir, D, porque não parte quem não esquece, quem se deixa marcar, a tinta indelével, que tem memória, quem guarda fundo. Os 16 minutos de Órion, ou os 16 anos da nossa grande energia (efémera, dizes tu...? Nem tanto, estamos aqui), são peça, roda dentada, tijolo, alicerce, pedaço de mim.
Não escrevo. Mas arrepio-me com a vossa escrita e com a vossa coragem de ainda escrever (cada vez melhor), e tu, D, tens sido a grande revelação (onde é que eu andava com a cabeça, aos 16?). Lembras-me José Luis Peixoto. José Riço Direitinho. Muñoz Molina.Susana Fortes (Querido Corto Maltese).
Obrigada pela tisana. Soube-me bem: quente, suave e aromática, como uma tisana deve ser.
Esqueci-me de dizer: deixo-te com as tuas mulheres da linha, H e M, que devem estar de regresso, inspiradas, morenas, solares, salgadas, e vou eu a banhos. Não fui grande companhia, mas esive cá.E volto.
Merecida tisana para a nossa eterna gabbiano...
Sei que não partiste Gabbiano. E saber que nos acompanhas é uma motivação. Por isso a tisana...
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