sábado, março 08, 2008

a morte trouxe-lhe o rosto

A morte trouxe-lhe o rosto. Nunca dela vira um retrato senão agora, depois de impossível. Sabe-lo, não me era preciso.

Soube tardiamente da sua morte. Às vezes acontece não saber nada do mundo e depois sou supreendida assim. Maria Gabriela Llansol. Ainda perguntei “ morreu ?” como se isso nunca fosse possível ou isso não fosse nada.

Conheci-lhe então o rosto. Mas eu acho que não precisava dele, de o saber. Ela era uma mulher que, em mim, se materializada na escrita. Se dela, cedo, comecei a admirar as palavras mesmo sem as entender, para quê saber do rosto ? Não foi assim um acréscimo, sabe-lo. Como não foi um decréscimo, saber–lhe da morte.

Confirmo agora tudo isto, porque a brisa da tarde continua a mesma, os ruídos do mundo chegam-me longínquos e os barcos, ao fundo, seguramente se fazem ao mar. A mesma ordem sussurrante da vida. E sem ela, tudo continua igual.

Talvez ela tenha dito as palavras todas e morreu.

Eu tenho-as ali, no mesmo lugar da estante, a apanharem a mesma brisa da tarde.

1 Comments:

At 9:37 da tarde, Blogger Mónica (em Campanhã) said...

acho que ela ia gostar desse epitáfio: talvez tenha dito as palavras todas e morreu.

 

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