Portugal às postas
Pega-o pelo lombo, a mão entre Coimbra e Viseu, o bisturi na mão de um bispo e deixa-o cortar às postas. Três postas longitudinais de Norte para Sul. A posta Braga-Setúbal da indústria e do povoléu. A posta Vinhais-Faro dos indecisos. A posta Chaves-Vila Real de Sto António da raia hispânica. Depois amanha-o. O mármore do Alentejo. O volfrâmio da Raia. O calcário do maciço estremenho. O arazil da Gândara. As espinhas de peixe da zona económica exclusiva, o bom pedaço, crustáceo, de lagosta «off-shore» da Madeira e a massa de hóstias dos Açores. Olha-o do céu. Centenas de aviões indecisos para poisar entre a OTA e Rio Frio. Opera-lhe a cabeça. Vísceras de Camões, Pessoa, Salazar e escamas de miolo PALOP. Esquece o PREC, Cunhal versus Soares. Reza-o. Põe uma coroa de flores na Fátima dos pastorinhos. Sabe da sua política. Vê o livro de faltas da Assembleia da República por serviço externo e estuda a cabeça do Otelo. Apresenta na data prevista a tua declaração de rendimentos. Mete à vontade despesas de farmácia, Portugal doente. Corta-lhe o rabo «ALLGARVE» e vendo-o aos ingleses. Aprecia os ferrarrrrrrrrris do Vale do Ave e aplaudi-os nas outras estradas do rally de Portugal. Inscreve-te na Universidade Independente e compra a troco de uma posta de diamante um curso de filosofia, mesmo que nunca saibas quem foi Camus e o Mito de Sísifo. Emprenha a mulher-a-dias e obriga-a a tomar a pílula do dia seguinte, porque não gostas do rigor do preservativo. Telefona para Bruxelas e pede dinheiro para os próximos compromissos. Leva os meninos à missa e fica cá fora a beber branco com pevides e tremoços. Joga à lerpa e compra um cativo num dos muitos estádios do EURO 2004. Vai ao centro comercial, veste o fato-de-treino, não corras que morres, bebe um favaíto e defuma um ventil, compra, leva cheiro barato para o sovaco, cheio o carrinho para satisfazer a sogra, desvia os olhos da tua mulher das prateleiras e os teus do busto saltitante da miúda da caixa. Deste uma estalada no miúdo porque chorou pelo chupa? Fizeste bem. Isso é educação ao nível do teu 8º ano abandonado. Leva a família à praia e apinha-a debaixo do chapéu onde na cadeirinha sem compromisso tentas acabar as palavras cruzadas. Queres uma deixa? Porco com duas letras, António? «Tó!», meu burro! Reclama por um SAP. És doente de proximidade. Não queres é tribunal perto, não te dá ao jeito, jogo que perderias sempre. Compra uma Moleskine e aponta a tua história neste Portugal. Aponta a tua vida. Põe-lhe pelo meio um verso do país de poetas e dedica-o à secretária que levas a almoçar no seu dia de anos, prometendo que te vais divorciar. E já agora, dorme nu como Portugal se encontra e esconde na gaveta o pijama às postas azuis e brancas. Liga o aquecimento do gás natural da Argélia, enquanto a mulher rectifica o cromado para a manhã seguinte. Coisas de espelho, postas de intimidade apenas. E, quando te chateares com tudo isto, volta ao útero da tua mãe, começa de novo e inscreve-te, logo cedo, branco no preto, nas aulas de Portugal do António Barreto.
1 Comments:
soberbo, como nos vens habituando.
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