A Ti Gracinda
A Ti Gracinda, 81 anos, viúva muito viúva, dona de uma educada elegância e herdeira de uma das últimas tascas da Redinha, vivendo sozinha, caiu outro dia ao chão ao levantar-se pelas 7 da manhã.
Descrever a tasca é falar de mármore e mobiliário de madeira antigo, exército de copos de várias graduações, foscos de sarro como óculos viúvos e tem de animação serena o esvoaçar das moscas como os aviões nos aeroportos atraídos por vinagre ao chão do mármore, onde as estações trazem desfiles de condutos para o aconchego do vinho, que prepara, disponível, com velhos requintes: hoje castanhas assadas!
Tem um filho presente, o Ti Albino e um neto, o Ti Gil. Não lhes conhecemos das mulheres, na tasca delas ouvimos apenas falar. Ali tratam-nos todos por “Ti”: o Ti D, o Ti RB, o Ti RC… em conversas de fim de tarde onde o tempo se alimenta de memória.
Hoje contou-nos a queda de forma tão tranquila como a idade:
«Levantei-me, senti uma tontura e cai. Chamei por ajuda quase duas horas até o Gil arrombar a janela, erguer-me, chamar a ambulância e levar-me para o hospital. Cá estou enquanto Deus quiser.»
«Levantei-me, senti uma tontura e cai. Chamei por ajuda quase duas horas até o Gil arrombar a janela, erguer-me, chamar a ambulância e levar-me para o hospital. Cá estou enquanto Deus quiser.»
E enquanto eu bebericava o resto do branco com o Ti RB e o Ti RC, acrescentou o que retivemos de essencial:
«Ofendi a coluna, foi o que foi!»
Deus a faça abrir-nos a porta todos os dias.
«Ofendi a coluna, foi o que foi!»
Deus a faça abrir-nos a porta todos os dias.
1 Comments:
Boas idas e vindas é o que desejo aos três Ti's. Gostei particularmente da frase «Ofendi a coluna, foi o que foi!». Do mais genuíno. Proponho que seja considerada frase com D.O.P.
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