fogo
moro mais ou menos no sítio de onde foi tirada esta fotografia e, no entanto, só o despertador me acordou na sexta-feira, já o incêndio lavrava há 2 horas. estranhei a ausência de tráfego ao abrir as persianas mas como há outra casa a tapar-me a visão da rua, não a valorizei até ver uma carrinha da RTP e um carro da polícia a entrarem na rua em sentido proibido. não se ouviam sirenes e não havia fumo nem cheiro a queimado na rua e assim pudemos dormir descansados a nossa madrugada.
fiquei inquieta quando percebi que um prédio inteiro (lindo, que vi, dia após dia, a ser recuperado) tinha ardido nesse sono tranquilo. e se fosse um dos prédios em ruínas que temos mesmo colado ao nosso? e se fosse o nosso (um cigarro mal apagado do fumador inveterado e ínsone que é o nosso vizinho de baixo - já um dia lhe toquei à campainha ao ver o fumo a sair da sua varanda)?
pouco depois, ao passar ao largo do incêndio, a casa já destruída, esventrada, fumo intenso a sair por todos os poros sob a chuva miudinha, senti uma angústia aterradora - igual à que senti, em 1992, quando ardeu, também de noite, a minha faculdade e ainda cheguei a tempo de ver as labaredas. um desespero que por instantes me esmagou o peito. como se conhecesse aquele fogo e o seu poder destruidor desde o princípio do mundo. tenho a certeza que o conhecimento do fogo e o medo violento que ele me traz estão inscritos há milhões de anos na minha memória genética.
3 Comments:
consegui arder-te o silêncio da escrita...
Não me apercebi que esteve tão perto.
Lembrei-me de ti nesse dia. Mas como não fazia ideia de qual seria a tua rua...Felizmente passou-te ao lado. Abraço de cá
PS: custou-me validar hoje, a palavra era submices :)
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