segunda-feira, julho 30, 2007

Pequena rota pela direita

Sai cedo antes que o sol te deite no saco-cama a apanhar o seu olhar. Veste-te de fresco e leva fruta e água para o caminho. Apenas por meu desejo, veste os calções de Valladolid e a t’shirt de Hong Kong. Passa a cancela de madeira e segue pela direita a estrada de terra batida. De vez em quando surgem mimosas e uma das nossas fotografias ainda por revelar. Logo abaixo, do lado direito, um pequeno carvalhal ainda resiste como uma ilha no oceano. Continua a descer. Passa a ponte sobre o rio. Bebe na ponta da ponte uma mão cheia de água. A capela aparece logo a seguir à sombra do cipreste. Entra. Reza uma ladainha a nosso favor à Sra. do Círculo. Logo após a capela, uma bifurcação. Vai pela direita baixa até à aldeia. Entra na taberna do Adaíl, fala-lhe em francês, bebe um copo de branco fresco, come azeitonas, uma talhada de queijo da mãe (pede, em francês de emigrante, que ele arranja!), molha um pouco de pão no azeite e leva-o aos lábios. Segue o desenho que deixei esculpido a navalha na mesa do canto e, outra vez pela direita, entra na estrada de calçada. Roda pela tua direita até à sombra dos plátanos. Ouve a música que escrevi apenas para ti, que só se ouve de olhos fechados, depois de comeres o primeiro cacho de Cardinal na cepa ao cimo do carreiro. Contorna a vinha e o olival. Entra no caminho de areia e segue as pegadas dos animais. À esquerda estão uns chinelos que deixei para te suavizar o andar e um mapa do caminho recortado na casca de uma laranja. Debaixo da nogueira deixei também a nossa fotografia de quando fizemos isto juntos. Guarda-a para ti! Estende na sombra o saco-cama e espera-me. Pode ser que te apareça e nesse lugar colocaremos a nossa cruz! Nunca faças isto pela esquerda, porque por aí nunca darás com o caminho. Se o fizeres, não terás as fotografias por revelar, a água do rio, o momento de rezar, o copo de branco do Adaíl, o sabor do azeite, o queijo da mãe, a música que escrevi, a sensação das uvas entre os dentes, os chinelos para te suavizar o andar e o mapa perfumado. Se fores pela esquerda, ficas presa na cancela onde da outra vez, debaixo de uma pedra, mulher ao sol, corpo ao sal, pela sua luz perdeste todos estes sabores e o meu coração.

2 Comments:

At 10:59 da tarde, Blogger Afectos said...

Reconheço que é um bom guia... Ainda não disse mas afirmo agora que é uma boa e excelente escrita.

 
At 11:15 da tarde, Blogger Afectos said...

Não disse mas parabéns pela facilidade de expressão "tão fácil". Eu só me contento por hora "sem" vergonha em ler...

 

Enviar um comentário

<< Home

Web Pages referring to this page
Link to this page and get a link back!