terça-feira, junho 12, 2007

10 de Junho


O meu avô materno, António de Pádua, (conta a minha mãe de ouvir menina, à mesa dos almoços caseiros) que o pai, sem nadinha a ver com o 13 que aí vem, exclamava no século salazarento a cada aparição, na TV, do dia da raça:

«PORRA! Outra vez o Camões!».

Depois, educado, pensava «foda-se!» e resguardava-se no Guerra Junqueiro, no Eça e no Camilo, anti-clerical, acutilante e romântico, temendo apenas as ordens da mulher, avó Beatriz.

Quis a vida e o mundo que o herdeiro varão e família fossem homenageados, plural magestático, às mãos do Cavaco de 10 de Junho, pelo trabalho de anos à frente da Associação para Recuperação de Cidadãos Inadaptados da Lousã – ARCIL.

Tem um filho nesta casa, lutando pela sua cidadania. O meu primo João António «Jone», nascido por eles na Angola vivida na diáspora (nome que para mim sempre soará a origem Bantu, etnolinguístico Kimbundo, Ganguela ou Nhaneca-Humbe, porque me apetece) é, nos seus condicionalismos, dos mais felizes da família.

Cavaco, metódico, foi ver antes. O Jone fez-lhe, moldando o barro, uma espécie de «quizaca com moamba de ginguba» acompanhada a «pirão», rindo muito. Depois chamou o varão Zé Manuel ao 10 de Junho, sentou Sócrates a bater palmas e entregou-lhe uma condecoração da Pátria reduzida sem a África onde foram felizes.

António de Pádua, ainda indeciso no purgatório, pronunciou finalmente um «foda-se!» em alto estilo – como hoje dizem os seus netos com educada frequência, lendo-lhe os mesmos livros! – e disse outra vez «foda-se!» e «quem me dera poder estar ali com o meu filho, o Sócrates e o Cavaco sem o Camões!».

Talvez por isso e pela primeira vez a RTP não transmitiu a cerimónia na íntegra e quase, quase escondeu a porra do zarolho.

- Vês, avô, o que vale um bom «foda-se!» dito do alto do peito?

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