prova do contacto
É uma mala velha de couro vinda da história de um avô. Nunca viajei com ela e no entanto, hoje, em arrumações encontrei-a. Dentro dela, para além de muitos livros antigos e amarelados, estavam pousadas e escondidas muitas fotografias e provas de contacto. Minhas, a fingirem-se na história daquela mala de couro.
Escusado será dizer que nelas me perdi. Uma a uma. Revisitar e deixa-las respirar. Confronta-las, através de mim, com o tempo. Pu-las no chão, em cima da cama desfeita... organizei vagamente pelo tempo, desfiz a ordem e organizei por amores, desfiz os amores e juntei-as todas. Deixo agora anotações breves da prova do contacto:
1 - Tive um amor grande que, julgava eu, só tinha ficado registado em poucos e belíssimas fotografias. Mentira, tenho muitas. Há amores que se revelam tardiamente.
2 - Com o passar do tempo a fotografia ganha por si eternidade. As pequenas precariedades como a desfocagem, os erros de luz e enquadramento passam a inexistir na fotografia. Observa-se para além de tudo isso e a beleza revela-se. Seguramente estariam ali muitas fotografias a quem recusei álbum e exposição e que agora, precárias, se fazem bonitas.Porque o tempo as fez bonitas em registo.
3 - A beleza fresca. A nossa. Juvenil. Física. Percebe-lo sem inveja. Tão bonitos somos enquanto jovens, mas tão pouco subtis na beleza. Tão bonita é a frescura mas tão lisa. Sem subtileza, sem sabedoria que a requinte. Dói ás vezes perde-la, essa beleza fresca, mas seguramente outra se faz nessa degradação. Mais requintada, mais custosa, mais subtil. Mais ou menos física. Pelo menos assim o acredito eu que me deixei de ver ao espelho.
4 – Bastantes delas escreviam o olhar de uma longa viagem de comboio. Berlim, Hamburgo, Viena, Budapeste, Praga, Istambul, Veneza... que saudades do tempo que demorava viajar e viver, fazíamos kms sobre carris e desenhávamos a geografia entre estações de comboio.
5 – Mas a maior revelação são mesmo as provas de contacto a preto e branco. Muitas, contém fotografias nunca ampliadas.Contém registos que não me lembrava. Tem bocadinhos quadrados de memórias insignificantes feitos em lindíssimas fotografias. Bocados quadrados de momentos que se tornaram sublimes por terem sido registados. Ah... a esses tenho de os acomodar devidamente, recortar e colar num moleskine que irei comprar. Os duplicados ( tenho muitas provas de contacto em duplicado !) enviarei por correio a alguns dos visados. Um dia certo dia que ainda não sei. Por uma razão que desconheço. Mas na certeza de que devemos ter a prova do contacto.
4 Comments:
Gostei de ler. A mim também me acontece recordar com carinho. Recordar o que fomos – o tempo que não mais acabava. Hoje em dia estamos em trânsito. Vidas…
comecei a ler pressupondo que era texto do D e a meio comecei a perceber que era a tua escrita a tua vida, foi curioso.
quanto às provas acho que já há tempos aqui falei disso: a memória é muito traiçoeira e acomoda-se a um história que fazemos com ela. mas ao abrirmos o baú vemos que a importância das coisas não é proprocional a certas memórias que temos dela.
Recorta e cola. Uma noite veremos isso.
fui à cata das minhas provas e não é que as devo ter deitado fora??? deste-me uma vontade louca de pôr aqui uma
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