quinta-feira, março 13, 2008

Vidas no Sicó

O nosso trabalho é um prazer. Gente séria que trabalha comigo, abriga uma onda onde trabalho ainda é alegria. Insultamo-nos com classe. Um privilégio de quem quer ser parte. Admiramo-nos com classe. Um privilégio de quem reconhece no outro as suas capacidades. Entretemo-nos com classe. Gostamos uns dos outros e isso é o privilégio dos simples. Quantos nos gostariam de somar a nossa vida às suas vidas! Hoje, a combater o «You Tube» que ia ouvindo, por vezes desalinhado nas secretárias do serviço, liguei o iPOD às colunas do computador e toda a tarde bateu música nas orelhas dos amigos da nossa casa grande do trabalho dos dias. Sei que é um desacerto das tarefas dos costumes, mas, agradecido à vida, não temos balcão de atendimento público concorrido nem anfiteatro para dizer do que fazemos. Cumprimos! Trabalhar e cantar (ouviam-se dos gabinetes vozes cantando em sussurro que nunca imaginei que soubessem cantar!). Depois distribui em copos pequenos de plástico um digestivo sumário (irish wiskey em dose medicinal!) por todos os solidários amigos do meu trabalho, festa avulsa sem santo, ordem de serviço para beber na próxima meia-hora, como um salmo a cumprir neste dia do calendário. Assim nos aturamos. Assim nos consumimos como velas alegres. Vivemos tantas horas juntas, tantas horas juntos, que perturbamos a ordem religiosa das famílias. No aleatório da música foi passando tudo. O meu arquivo, o meu coração cantado do peito. O trabalhinho do dia correu bem. Sabes isso quando te sentes no teu serviço realizado. Enquanto me derem esta liberdade de animar os amigos com quem trabalho, a festa continua. No fim, o RB, viciado no «You Tube», disse para quem estava: agora tenho de ir para casa ler Fernando Pessoa! Deixo a dica e uma música que passou:

LIBERDADE
Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada, estudar é nada.
O sol doira sem literatura. O rio corre bem ou mal, sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca...




3 Comments:

At 7:29 da manhã, Blogger Cristina Gomes da Silva said...

Olha que bom! Pode ser que sirva de inspiração a alguns casmurros

 
At 9:06 da manhã, Blogger CCF said...

Quando puderes, passa por aqui na ESE...e traz O iPOD e os copos!
Abraços,
~CC~

 
At 9:29 da tarde, Blogger Mónica (em Campanhã) said...

alegria no trabalho é um privilégio. também falo de barriga cheia: apesar de todos obstáculos (papéis, insuficiências, desleixos) que se atravessam no nosso caminho de serviço público, trabalho com uma equipa nuclear de luxo (embora não dê para o wisky)

 

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